quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Pequenas sutilezas da Vila Planalto


Paróquia Nossa Senhora do Rosário de Pompeia - Crédito: Ana Lúcia Barreto Soares - Codeplan

Avessa à frieza dos blocos de concreto do Plano Piloto, ela se mostra impetuosa e rebelde. Suas ruas são estreitas, desordenadas e têm nome. As casas, definitivamente, não obedecem a um padrão, e, numa velocidade que parece ignorar qualquer regra, os barracos de madeira, originais dos tempos pioneiros, vão sendo engolidos por residências em concreto, cheias de pompa. Nesse lugar, que ouso dizer ser um dos mais peculiares de Brasília, diferentes gerações convivem lado a lado e ajudam a escrever uma história sem final definido. Essa é a Vila Planalto, que reúne em si todos os sons e cores imagináveis.

Sabe aquele ar de cidadezinha do interior? Foi essa a sensação que tive ao me mudar para lá no ano passado. Cheia de orgulho, sempre falo: “A Vila tem cara de cidade normal!”. Sim, pois para quem, como eu, não é natural de Brasília – e aí me perdoem os brasilienses –, soa estranha essa organização metódica em quadras e setores. As ruas da minha Fortaleza, ao contrário, são vivas e confusas. Os vizinhos se conhecem e, apesar da correria diária, conseguem estabelecer entre si um diálogo mínimo; nem sempre cordial, é claro, mas lá a indiferença passa longe...

Na Vila também é assim. Fico impressionada como as pessoas sabem da vida das outras. Com riqueza de detalhes. E todo mundo acaba se sentindo em casa... As crianças brincam na rua e fazem barulho, uma cena que é possível apenas onde ainda há liberdade. Liberdade essa que também permite encontrar praticamente tudo em poucos passos. Farmácia, mercadinho, padaria e até curso de idiomas... toda a praticidade para uma vida sem percalços, logo ali, na esquina!

A culinária é outro ponto forte. Os diversos restaurantes transformaram a Vila Planalto num paraíso para quem mora e/ou trabalha no Plano Piloto. Nesse itinerário gastronômico, tem espaço para delícias de todos os cantos do Brasil, sem contar nas opções “universais” de fast food e self-service. Em um dos meus recantos favoritos, de cozinha mineira, a dona cumprimenta os clientes na porta e passa em cada mesa para saber da satisfação do seu público. Sem contar no ambiente bucólico, que remete aos cenários de uma fazenda do interior, com seu mobiliário rústico e trilha marcada pelos sons de uma viola. Um convite irresistível para uma prosa regada a cafezinho...

Os moradores mais antigos contam que a Vila já mudou muito, mas sua essência aconchegante tem sobrevivido bravamente com o passar dos anos. Tem problemas? Sim! Infelizmente, o poder público parece ter esquecido que aquele lugar existe, pois quase não se vê investimento na revitalização de ruas e áreas comunitárias de lazer. Outra crítica recai sobre os condomínios de quitinetes que, construídos onde quer que haja um pedacinho de terra, sem o menor planejamento, enfeiam o bairro.

Mesmo com esses entraves, morar na Vila Planalto tem sido uma experiência fantástica. É como estar na fronteira entre o passado e o futuro. É conviver com tantos contrastes e não se sentir apenas mais um na multidão. É perceber que até hoje, mais de seis décadas depois, o bairro manteve o propósito pelo qual foi criado: ser um verdadeiro lar para aqueles que chegam.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Seguir o próprio caminho



"Nunca se ressinta do sucesso de outro homem, filho. Lembre-se, cada um de nós vive seu próprio destino. Nossas vidas correm todas em vias paralelas - o sucesso dos outros não nos puxa para baixo, e seu fracasso não nos empurra para cima. Concentre-se apenas nos seus próprios boletins escolares e no seu trabalho".

A frase foi retirada do livro "A doçura do mundo", da escritora indiana radicada nos Estados Unidos Thrity Umrigar. Li-o recentemente e, dentre tantas lições que ele pode me oferecer, elejo uma: a necessidade de cada um de nós seguir seu próprio caminho.

É incrível como costumamos nos comparar com os outros. No trabalho, em casa, na sociedade como um todo, estamos sempre em busca de um referencial. Até aí, tudo bem. Bons exemplos devem inspirar nossas atitudes e, quando possível, mudar nossa postura, quebrar nossos paradigmas.O problema é quando nos deixamos levar pela vida dos outros e esquecemos quem nós somos.

Nenhum história é igual a outra. Temos nossas próprias qualidades e limitações, o que verdadeiramente nos torna únicos, especiais. Não podemos nos forçar a um caminho, a uma personalidade, a um estilo de vida, apenas porque esses deram certo para outra pessoa. Não podemos controlar o tempo e esperar que todas as coisas aconteçam dentro do que planejamos, ou mesmo nos impor metas inalcançáveis. Sabe qual o resultado para isso? Frustração.

Certa vez, eu conversava com uma pessoa que dizia se sentir infeliz na profissão, pois nada que havia pensado para sua carreira dera certo. A vida tinha tomado rumos diferentes, a maioria de seus colegas de faculdade eram hoje bem-sucedidos e ela estava dando ainda os primeiros passos em um segmento que, a princípio, nada tinha a ver com o que sonhara.

E eu pensei que comigo também foi assim. A diferença é que fui aprendendo a aceitar o que a vida me dá. Porque não adianta teimar com ela e ficar eternamente olhando para os lados à espreita de algo que, provavelmente, nunca virá. Não é fácil, é claro. Porque muitas vezes nós temos a prepotência de achar que está tudo sob controle e que nada irá contrariar nosso plano "infalível".

A estrada, porém, não chegou ao fim. Há muitos atalhos ainda. O que importa é o que vamos fazer com eles daqui para frente. Podemos ignorá-los, mas, ao mesmo tempo, correr o sério risco de perder nossa felicidade. E então? Que faremos?

Eu escolho e vou lutar pela liberdade de seguir meu próprio caminho, sem me preocupar se quem está ao lado engatinha ou está no auge da corrida. Enquanto houver chão, acompanham-no os passos e, de preferência, bem firmes.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

A vida com o tempo

Com o tempo, você aprende que nem todas as coisas são possíveis, que nem todas as pessoas são iguais, que nem todos os finais são felizes. E que não adianta se debater, porque, no fundo, nós não temos mesmo o controle sobre tudo.

Com o tempo, você aprende que há certas circunstâncias inevitáveis e que será em vão se culpar por isso. E você percebe que as experiências - sobretudo as mais difíceis - é que fazem você ser quem é, porque ninguém mais poderia viver o que foi reservado apenas para você.

Com o tempo, você se convence de que não há nenhum motivo especial para ter acontecido isso ou aquilo; você é simplesmente um ser humano, e a dor é sempre uma possibilidade, assim como a alegria plena.

Com o tempo, você se desfaz das máscaras que te aprisionavam e descobre que, por trás de uma muralha de força e compreensão, há alguém frágil e inconformado. E você respira aliviado porque, sim, você não é tão "perfeito" quando imaginava(m).

Com o tempo, você aprende a dizer "não" e, com isso, a ser honesto consigo mesmo. Também começa a dizer "sim" quando a vida te pede mais uma chance, nem que seja para derrotar o medo e provar que é possível levantar outra vez.

Com o tempo, você começa a caminhar de forma mais leve, desfazendo-se do peso trazido por seus questionamentos, fracassos e - por que não? - sucessos. Você continua sonhando, mas já não carrega as expectativas de que tudo se dará da forma como você projeta.

Com o tempo, você percebe, enfim, que não fomos criados para encontrar todas as respostas, fórmulas e razões. A vida é e sempre será um mistério, que não cabe em nós, mas que foi feito para nós. Então simplesmente viva, e tenha a certeza de que isso já é tudo.

sábado, 5 de novembro de 2011

Fique calado(a), por favor!

Eu costumo ser adepta da máxima: "Se você não sabe o que dizer para alguém num momento difícil, fique em silêncio e isso basta". Mas, infelizmente, muitos não agem assim. As pessoas têm necessidade de falar, falar e falar e, por esse motivo, se tornam inconvenientes.

Depois de evitar oportunidades de me expor e respirar "aliviada" pensando que ninguém iria mais querer invadir minha intimidade, toda a expectativa segue pelo ralo. Será que é tão difícil perceber que existem certos assuntos que não merecem ser comentados, muito menos na presença de outros ouvintes? Será que as pessoas acham que é fácil esconder as feridas e responder que "sim, estou bem" apenas para desviar o foco da conversa?

Nessas horas, a vontade que tenho é de sumir, me recolher no refúgio do quarto até que todos finalmente esqueçam o que passou. Ou, no mínimo, dar uma resposta malcriada e deixar a pessoa pagar o preço da sua intromissão.

Não tenho obrigação de dar satisfações de como me sinto e do que pretendo fazer. Nem mesmo sei o que está acontecendo comigo... Não gosto de falar de mim, da minha vida, da minha dor. Não para todo mundo. Alguns podem dizer que externalizar esse turbilhão de sentimentos ajuda. Quem sabe em um outro momento, não agora.

Pode até parecer um comportamento egoísta, ingrato. "Como não retribuir à preocupação das pessoas respondendo como você está?", pensarão alguns. Mas eu sinceramente acho que essa não é a melhor forma de agradecer a alguém por sua atenção ou carinho, até porque quem realmente ama saberá compreender que existe hora para tudo, principalmente para o desabafo.

Meu conselho é o seguinte: se você faz parte desse grupo que, mesmo sem perceber ou com a melhor das intenções, tende a se exceder nos seus comentários e indagações, fique calado(a), por favor! E tenha a certeza de que, quase sempre, isso é o melhor a se fazer.

E então, continua curioso (a)?

>> SUTILMENTE

Composição: Samuel Rosa / Nando Reis

E quando eu estiver triste
Simplesmente me abrace
Quando eu estiver louco
Subitamente se afaste
Quando eu estiver fogo
Suavemente se encaixe

E quando eu estiver triste
Simplesmente me abrace
E quando eu estiver louco
Subitamente se afaste
E quando eu estiver bobo
Sutilmente disfarce
Mas quando eu estiver morto
Suplico que não me mate, não
Dentro de ti, dentro de ti

Mesmo que o mundo acabe, enfim
Dentro de tudo que cabe em ti
Mesmo que o mundo acabe, enfim
Dentro de tudo que cabe em ti

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Notícias vazias



Nos bancos da faculdade, aprendi que o inusitado é um dos fatores que definem o que é ou não notícia. Tem até uma frase, famosa entre os profissionais de comunicação, que diz que "Quando o cão morde o homem, não é notícia; quando o homem morde o cachorro, é notícia".

Não sei o que estão fazendo desse conceito. Mas o fato é que as notícias têm despertado cada vez menos o meu interesse. Tem portal na Internet que leva esse critério ao pé da letra e delimita uma seção exclusiva para assuntos bizarros. Pessoas com comportamentos estranhos, animais com anomalias genéticas, acidentes inacreditáveis... O grotesco tem espaço garatindo na mídia.

No meio do bombardeio de fatos "curiosos", também imperam informações sem qualquer revelância, apenas porque dizem respeito a "personalidades". É a atriz que deixa celulite à mostra, é o cantor que é visto em um bar tomando uma cerveja gelada com os amigos, é o apresentador de TV correndo na praia e dando uma pausa para uma água de coco... "Vejam, eles são como nós!", alardeiam as revistas de celebridades. Isso não é óbvio?

A impressão que tenho é que o mundo está completamente anestesiado. É tanto lixo despejado sobre as mentes das pessoas, que, aos poucos, elas vão perdendo a capacidade de raciocício crítico e, se bobearem, sua própria autonomia. E isso vai desde as coisas mais simples, como copiar o visual da personagem popular da novela ou assistir a determinado programa só para não ficar de fora das rodinhas, até imaginar que ganhar muito dinheiro independe de esforço ou estudo, que basta ter um pouco de sorte e simpatia ou dar o velho "jeitinho brasileiro". Se os meios de comunicação mostram isso, então é verdade. É, Brasil... A gente se vê por aqui!

É uma pena que coisas realmente interessantes tenham tão pouca repercursão. Projetos que estimulem a criatividade de crianças e adolescentes, iniciativas que valorizem a vida e a família, propostas políticas que tragam benefícios para a população, lugares escondidos que mereçam ser visitados, ações de sustentabilidade vividas na prática... Tudo é mostrado como se fossem casos isolados, inéditos, quase beirando ao bizarro. Pauta fria, ou a "boa notícia" do dia. Enquanto isso, gastam-se tempo e dinheiro com factóides que não acrescentam nada. É a desonesta lógica da audiência, ou do velado desserviço público.

DICA: O filme "Uma manhã gloriosa", de Roger Mitchell, conta a história de uma produtora de TV que tem a missão de levantar a audiência de um jornal matinal. Para isso, ela lança mão de pautas de relevância duvidosa, mas que prometem agradar o público. Uma crítica que rende algumas gargalhadas.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Sonhar é universal



Nessa semana, assisti ao filme “O Palhaço”, de Selton Mello. Já esperava um roteiro inteligente, repleto de significados, mas saí da sala de cinema encantada com a história e os personagens. Humor na medida certa; participações surpreendentes de atores consagrados; trilha sonora marcante; ambiente lúdico, bem a cara do Brasil... Poderia passar minutos listando qualidades técnicas, mas um aspecto retratado no longa-metragem se sobressaiu: a capacidade de sonhar, tão bem expressada na vida do palhaço Pangaré, interpretado pelo ator e diretor Selton Mello.

Em meio à dura realidade do interior do país, junto com a trupe do Circo Esperança, o artista Benjamim – o Pangaré – encarava, a cada espetáculo, o desafio de extrair risos da plateia. Mas ele achava que já não tinha mais tanta graça assim... Na verdade, o jovem andarilho travava um embate consigo mesmo, buscava sentido para a vida além das lonas. Seu sonho? Ter uma carteira de identidade e um CPF, pois tudo que ele sabia sobre si estava registrado numa certidão de nascimento velha e rasgada, que, para o mundo, em determinadas circunstâncias, não tinha tanta validade. Além disso, ele tinha um objeto de desejo: um ventilador. Uma perfeita metáfora de que sonhar é universal.

Para tornar concreta sua imaginação, Pangaré precisou romper algumas “fronteiras”; a principal delas, a do medo. Não é fácil sair da zona de conforto, trocar o certo pelo duvidoso. Mas toda mudança envolve riscos e perdas; são etapas que não podem ser puladas. Uma boa dose de coragem é necessária para desbravar o desconhecido, mesmo que nosso destino final seja, ironicamente, o ponto de partida.

Certa vez, uma amiga escreveu que é preciso aprender a não criar expectativas. Achei a frase controversa, um pouco ousada talvez. Como viver sem criar expectativas? E para onde iria nossa capacidade de sonhar? É certo que ninguém deseja experimentar a dor e a frustração ao se lançar ao novo. Mas continuo a acreditar que nenhuma pessoa encara uma nova fase já se antecipando ao sofrimento, senão, provavelmente, não daria esse passo.

O fato é que nós somos movidos por sonhos. É esse o combustível que nos faz buscar uma vida melhor e mais digna; que nos instiga a mudar o rumo quando já não nos sentimos mais felizes e completos; que nos faz, enfim, rever nossos conceitos e – por que não? – descobrir em nós capacidades tão especiais que nem poderíamos imaginar. Sonhar, como diz o ditado, não faz mal. E o melhor é que, como poucas coisas nessa vida, está ao alcance de todos.

Foto: Divulgação